quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

oração comum





por ser parceiro da dança dos sentimentos
um eterno aprendiz da abstração das vaidades
sei dos caminhos para detalhar as trilhas de sonhar
alimentando minha arte nos infinitos estradeiros
pelo alheamento íntimo dos semeados quintais
nos meus aprendizados de adormecer a realidade
descobri que o sonho acordado faz estreitar beijos
que todos os meus versos pairam e prosam o ar
minha poesia se mistura à giração das chegadas
gosto de abraçar os mais diversos esquecimentos
e por ser herdeiro nato da estação mãe lembrança
fiz mestrado na ciência de sussurrar com o tempo
não sei gostar da obrigação controlada das horas
tenho inclinações com a constelação portas abertas
trago nos olhos a liberdade pela revolução palavra
para as vestes de direita tenho porções de atalhos
feito aquarela de arco-íris a dar cor aos madrigais
numa oração comum entoada como hino de luta
em resistência aos fúnebres temerosos golpes
e nessa nossa longa social sentença de viver
confesso em próprio sangue a minha anarquia
ainda que me esquartejem a esquerda...
                                               

terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

sobre a intolerância





quase e sempre a obrigação do silencio imposto
veste-se de coadjuvante tenebroso
desses longas-metragens com roteiros
medianos obscuros e castradores
assim como um tolo viciado amuleto
no seu carente invólucro sombrio
de ianque protagonista da trupe fidalga
incapaz de render em cuspes
uma linha ou lauda verborrágica
do seu prevaricado discurso encomendado
que apenas reflete o ego individual
em nome de uma meritocracia recalcada
devo confessar veementemente à corte
que o mundo não é a vossa extensão cortesã
nem cabe na intolerância do vosso curral
a ausência da graça esvai o retrato
e o retardo d’alma chumba a queda iminente
é no lesar do timão que se desorienta
a nau ao desvario das derivas
é no cansaço do pirata que o cupim faz festa
e o alienado papagaio certifica suas cópias
como já dizia o digníssimo diabo
diante da cristandade inquisitória
digas com quem andas que eu te direi se vou
na falta do teco tico-tico no fubá
é pimenta no porco e pregas na porca
torno a repetir como dito redito
ainda que o rito seja de praxe e prazer
a generosa loucura é coletiva
e tem pacto íntimo de amor com a arte
é como sentir o leve abraço desnudo
dos que sabem fingir não saber
para no constante e incansável
exercício reaprender novamente
já isolada jaz insana aprofundada
em tédio no fúnebre calabouço
do branco abraço dos fracos
no desserviço de arrotar desvarios
prostra-se a ignorar todos
e quaisquer pensamentos contrários
sem nunca aprender
o que ainda lhes é de certa forma estranho...

sábado, 10 de fevereiro de 2018

camufla-dor




muitas vezes a beleza inanimada dos galhos
que secam seus ramos a germinar paisagens
serve de arrimo as despercebidas folhas secas
que por horas bailam a retratar coloridos rastros
a rodopiar pegadas no vento que regeneram os dias
como se disfarçassem ao chão lembranças outonais
aos olhares que tardam no repouso afago de um abraço
e põem-se a detalhar a quase imperceptível pulsação
reproduzida milhares de vezes nas asas dos colibris
que chegam e vão numa revoada que poucos percebem
por ser aprendiz do tempo sei dos ensinamentos
de brotar palavras na mão para alimentar os diálogos
de deixar no sonho minhas vestes de camuflar a dor
aprendi que o sorriso abriga ao lado sua itinerante tristeza
ainda que estranho sejam os lastros dessa íntima  amizade
nessas duras e intensas alternâncias dos sentimentos
a feliz cidade é solidaria ação de contemplar o outro lado
num alastrar-se por todos os caminhos de não findar
e sem a menor necessidade das explicações cobradas
retorna feito mãe giração em forma de reticências...
devo confessar como quem rascunha detalhes
que passar  pelos intermináveis muros individuais
deixando digitais como abrigo sublinhado em seu reboco
faz entranhar a graça repaginando a arte dos coletivos

terça-feira, 6 de fevereiro de 2018

narcisismo medieval


não há nada mais triste
que a triste cidade ao compreender
que os sentimentos sórdidos
são instintuais à raça humana...
ente!...  cabra!...  o ser humano!...
passa por todos os tipos de dificuldades
desde quando nasce num rasgo de grito
até  prematuramente ser desmamado
cedo já começa a trabalhar pela obrigação de ser gente
e ao mesmo tempo ainda tem que achar tempo para estudar
depois de penar durante anos eis que se torna um “vencedor”
jamais esquece o que passou e de uma forma narcisista
passa a bradar vantagens a cuspir no vento como se fosse o tal
como se fosse melhor do que aqueles que não lograram o seu feito
e o pior é que diante dos políticos tropeços golpistas do destino
das malditas reformas macabras 
contra direitos adquiridos em luta
solta o ranço do seu macabro egoísmo
de inquisidor incontido e descaradamente
“acusa o outro daquilo que faz daquilo que é”
dana-se  a grunhir verborragias
entre outras sandices de baixo calão
desqualificando índios negros menosprezando usuários de cotas
nordestino passou a ser praga homossexualismo coisa do demo
nada presta e tudo à sua volta tem que valer aquilo que pesa
acha que traz as virtudes do mundo 
no beiral do seu oco umbigo
que traduz a vontade popular
no seu ápice de bom trabalhador
quando na realidade tem o objetivo mediano
de atingir quem verdadeiramente trabalha
quase em forma de total submissão
encurralados na eira à margem
dessa arrogante sociedade escravocrata
devo confessar no alto dos tamancos...
aos meus caros aspirantes das ante-salas vip’s
das páginas piegas das tais colunas sociais
dos maquiados jornais e revistas familiares
livrem as almas da incinerada tortura
que contra pesa em suas consciências...
a fome mata se não houver massa
faltará mão e jamais distribuiremos o pão
tentem humildemente refazer o exercício básico do desapego
basta sentar numa carroça na ausência do seu titular puxador
fechar os olhos e refletir longa e despretensiosamente sobre si
quiçá talvez consigam conter a ignorância e seus preconceitos
passando a dar ouvido ao que toca esses embrutecidos corações...
ninguém é alguém sozinho e como dizem meus amigos poetas
“não há como ser feliz sem que o outro não seja”
“só a poesia salva”...